segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Centenário de nascimento de Vinícius é celebrado



Toquinho e Paulo Ricardo dão pontapé inicial às comemorações de existência um dos maiores artistas da MPB


Arquivo Hoje em Dia

Vinicius de Moraes e Toquinho

Os músicos e compositores Vinicius de Moraes (e) e Toquinho



A Música Popular Brasileira já começa a comemorar o centenário de um dos seus maiores artistas, o poeta Vinícius de Moraes, que nasceu em 19 de outubro de 1913 e morreu em 9 de julho de 1980.


Embora as comemorações oficiais estejam programadas para começar em outubro de 2012, um amigo especial do poeta decidiu antecipar-se aos protocolos.


Toquinho, ao lado do cantor Paulo Ricardo, lançou há pouco mais de duas semanas um álbum onde fazem um duo em 13 canções de Vinícius.


Um trabalho que começou a ser produzido ainda durante as comemorações dos 50 anos da Bossa Nova, em 2008, e que agora é entregue como um presente.


“Vinícius foi um marco em minha vida. Ensinou-me muito, tanto profissional quanto pessoalmente. Aprendi sempre respeitando sua experiência. No final, trocamos aprendizados e juventude”, diz Toquinho, em entrevista por e-mail.


O diretor geral da Geo Eventos, empresa responsável pela organização do centenário, Leonardo Ganem, afirma que exposições, mostras de poesia e arte, além de shows com artistas convidados são algumas das atrações previstas para o calendário comemorativo.


O disco de Toquinho e Paulo Ricardo pode ser considerado o início da festa. “Quando começamos a criar o álbum não paramos para pensar no centenário de Vinícius, mas, seguramente, este trabalho pode representar o marco de início das comemorações”, afirma o amigo e parceiro do Poetinha.


No disco, clássicos como “Chega de Saudade”, “Tarde em Itapuã”, “Eu sei que vou te amar”, “Garota de Ipanema”, “Insensatez” e “Samba de Orly” ganharam nova roupagem.


O resultado revela uma sonoridade contemporânea – prova de que o obra é mais pop do que se pode supor.


Para a cantora e amiga de Vinícius, Miúcha, o poeta conseguiu como poucos construir uma poesia irretocável. “Talvez Vinícius fosse a alegria em forma de gente, um homem capaz de apropriar-se das palavras e traduzi-las como magia. Ele falou de tudo nessa vida e para ela deu-se inteiro. Foi um cavalheiro, um homem que conseguia conversar com igualdade com qualquer pessoa, de qualquer idade ou classe social”.


“São demais os perigos desta vida para quem não tem paixão”


Miúcha está rouca. A tosse insiste, mas quando o assunto é Vinícius de Moraes, nada a arrebata mais. Por telefone, do Rio de Janeiro, a cantora não hesita em falar do amigo e aponta as trufas brancas e o amor à vida, os traços aos quais sempre afeiçoa à Vinícius. “Veja como são as coisas. Há tanto a dizer sobre ele e me retenho às trufas que um dia ele deu a mim e a minha irmã”, conta, aos risos.


Junto com Vinícius, Toquinho e Tom Jobim, Miúcha gravou no Canecão (Rio de Janeiro), em 1977, um dos discos mais elogiados e bem quistos da MPB. “Foi uma turnê incrível. Éramos inseparáveis. E eu, a única menina entre aqueles meninos. Nos divertimos muito. Descobri que aprender sobre a vida ao lado de amigos é uma das melhores lembranças que alguém pode guardar”.


Filha do historiador Sérgio Buarque de Holanda (e irmã de Chico), Miúcha conheceu Vinícius ainda criança. “Meu pai sempre gostou de música e seus amigos iam para nossa casa cantar e tocar a noite toda. Vinícius sempre estava lá. É engraçado como a música foi capaz de aproximar gerações. Fui criada ao lado de Georgiana (filha de Vinícius com Lila Bôscoli). Nos casamos, tivemos nossas filhas, que hoje também são muito amigas. O laço da cumplicidade permanece”.


Para a cantora, o sucesso da arte de Vinícius estará sempre ligada à capacidade do poeta de lidar, de maneira carinhosa, com as palavras. “Sua poesia não tem idade. As melodias se adaptam a novos tratamentos musicais pelo vigor de sua simplicidade e ousadia”, completa Toquinho. Uma ousadia, que aliás, se transformou em sinônimo de saudade para os que tanto quiseram bem ao Poetinha.


“Ninguém cantou o amor como Vinícius”


“Toda a obra de Vinícius de Moraes pode se apropriar a qualquer época porque ele cantou o amor como ninguém fez”. Quem afirma é Toquinho ao ser questionado sobre a temporalidade da obra do Poetinha.


Coube, portanto, à maneira como as releituras das canções foram produzidas, a grande sacada do álbum “Toquinho e Paulo Ricardo cantam Vinícius”. Mantendo a harmonia, a dupla desconstruiu melodias e incorporou batidas elétricas.


“Passado o entusiasmo em tê-lo como parceiro, minha maior preocupação foi em não assustá-lo com a ousadia do projeto”, conta Paulo Ricardo por telefone, de São Paulo, aos risos, sobre quando foi apresentar o conceito do CD a Toquinho. “A harmonia sempre foi sua grande preocupação, mas as letras de Vinícius comungam com o passado e o presente”.


Embora tenham timbres e estilos completamente distintos, Toquinho e Paulo Ricardo concordam que talvez coube à seleção das músicas a maior dificuldade durante toda a produção do disco.


“Infelizmente tivemos que escolher alguns clássicos entre uma grande safra de beleza incontestável. Escolhemos as músicas que achamos mais representativas e adaptáveis a produção”, explica Toquinho, que lamenta não ter incluído no álbum o clássico “Minha Namorada”, parceria de Vinícius com Carlos Lyra.


Segundo Paulo Ricardo, a expectativa é levar para os palcos a parceria com Toquinho, mas ao contrário do que é apresentado no disco, a tecnologia e as batidas elétricas devem ficar de fora.


“Os shows devem contar apenas com voz e violão”, diz. “Ainda não há nada concreto, mas Belo Horizonte não ficará de fora, com certeza, caso haja essa turnê”, acrescenta Toquinho.


O diretor geral da Geo Eventos, empresa responsável pela organização do centenário de Vinicius de Moraes, Leonardo Ganem, explica que como o selo comemorativo do centenário ainda segue em fase de produção não é possível adiantar detalhes da comemoração oficial, “mas a captação de patrocinadores está a todo vapor”, garante.


Para Miúcha, que também planeja homenagear o amigo durante as comemorações do centenário, é preciso guardar com carinho e afeto o legado de Vinícius. “Suas músicas não são o retrato de apenas uma época. Elas falam para o hoje, para o que se vive neste momento, como se os versos tivessem sido escritos agora. É engraçado porque Vinícius tem uma canção ou um poema para cada circunstância da vida. Às vezes me pego rindo disso e sinto uma saudade imensa”.


“Quem de dentro de si não sai, vai morrer sem amar ninguém”


Vinícius não era um homem de poucas paixões. Passava horas dentro de uma banheira tomando uísque, gostava de bons restaurantes e foi um botafoguense apaixonado.


O futebol, aliás, era outro que lhe rasgava o coração. Em 1962, durante os jogos da Copa do Mundo – ano em que o Brasil conquistou o bicampeonato – o poeta desabafou: “Minha seleçãozinha de ouro, eu vos suplico que não jogueis mais futebol internacional, não. Meu pobre coração não aguenta tanto sofrimento”. E continuou: “Sabe Pelé, eu nunca chamei ninguém de gênio porque acho besteira, mas você eu chamo mesmo, no duro, você é o meu Garrincha”.


Os trechos fazem parte da prosa “Canto de amor e de angústia à seleção de ouro do Brasil”, onde o poeta também pede com jeitinho para que o time canarinho volte vitorioso: “(...) Por favor, ganhem logo e voltem para casa com a Taça erguida, bem alto (…) voltem porque senão a revolução em marcha não caminha, ela fica também encantada com a vossa divina mestria”.


Nascido em 19 de outubro de 1913, Vinícius casou-se nove vezes e teve cinco filhos. No hall dos muitos amigos que conquistou, estão Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, Fernando Sabino, Pablo Neruda, Oscar Niemeyer e Di Cavalcanti.


Em 1945, Vinícius sofreu um acidente de avião do qual não hesitou registrar: “Eu sou um sujeito que, modéstia à parte, sempre deu sorte aos outros. Menina que me namorava casava logo. Amigo que estudava comigo, acabava primeiro da turma. Sem embargo, há duas coisas com relação às quais sinto que exerço um certo pé-frio: viagem de avião e esse negócio de ser padrinho”, registrou na crônica “Batizado na Penha”.


Autor de dezenas de livros e centenas de poemas, críticas de cinema, peças teatrais e canções, Vinícius perdeu, em 1969, o posto de diplomata durante a Ditadura Militar.


Em 2010, o Poetinha recebeu uma promoção póstuma ao cargo de embaixador. Miúcha lembra que Vinícius foi expulso com base no Ato Institucional nº 5 (AI-5). “Ele era um poeta consagrado, mas não fora bem quisto pelo exército naquela época. Veja como o mundo dá voltas”.


Fonte: Hoje em dia

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